Baseado na obra de mesmo nome de Graciliano Ramos, o filme Vidas Secas de 1963 é magnificamente impactante e um elemento importante para o debate sobre terra e propriedade no Brasil, seguindo o eixo-temático do 8o ano. Salve salve pessoas... mais uma vez venho trazendo um dos filmes utilizados em sala de aula, pois entendo que essa obra tem inúmeros pontos a contribuir com a discussão.
Em primeiro lugar e mais diretamente, o tom minimalista do filme em preto e branco expõe de maneira impactante a realidade da vida no sertão do Nordeste. A vida seca transborda da tela. A aridez e inclemência do sol parece nos acompanhar a todos, enquanto acompanhamos Fabiano e sua família pisando sobre o chão seco.
Confesso que temi que a linguagem do filme não conseguisse manter a atenção do público adolescente de 13, 14 anos, mas fui surpreendido. Apesar do ritmo ser diferente do que eles estão acostumados, outros elementtos ajudaram a preder a atenção, como o filme ser dividido em três aulas, por exemplo. As imagens do filme dialogaram profundamente com a leitura de Os Sertões onde há um descrição exaustiva da flora e da fauna local por Euclides da Cunha, fator que também ajudou a familiarizá-los com a jornada. O caráter cíclico da seca (inclusive com a recente seca, uma das maiores das últimas décadas) também contribuíram na atualidade do assunto no imaginário dos estudantes.
Em segundo lugar, assim como o maravilhoso livro de Graciliano Ramos, a história se inicia e termina com aquela família rumando sem destino flagelada pela seca. O ciclo que marca a vida humana naquelas cercanias é apresentado em suas minúcias, sem falsas ilusões de esperança, na crueza da sobrevivência. A esperança que se mantém viva com a chuva, que engorda um pouco como os meninos de Sinhá Vitória, se esvai com o sumiço da água. A mesma marcha é retomada, enquanto os alentos, como a cachorra Baleia ficam pelo caminho.
Além disso, eu diria que está tudo lá: o patrão explorador; o Estado opressor; o banditismo como uma questão de classe, uma opção entre tanta miséria; o alento seja na cachaça ou nas folias populares; a desumanização do homem; o inferno dos condenados que surge nesse e não em outro mundo; a religião; as rotinas masculinas e femininas; a infância sem nome, cuja identidade é construída seguindo os passos miseráveis dos adultos.
Ainda que se trate de uma obra de ficção, há tanta história nessa narrativa, que ela dialoga profundamente com a realidade seja de 1938, de 1963 ou de 2013. Para pensar e tentar entender a história de seus avós, deles mesmo, do Recantos das Emas, do povo, dos retirantes... para tudo isso, esse filme se mostra um excelente ponto de partida para os estudantes.
Além deles se emocionarem com a morte da cachorra Baleia, rirem com os meninos tocando as cabras como se fossem bois, montando-as como vaqueiros mirins, se assustarem com a surra em Fabiano, se escandalizarem com a palavra inferno tantas vezes repetida ou não entenderem a necessidade de Sinha Vitória em ter sua cama de couro, todos eles percebem ali uma forma de existência humana. Uma forma de existência humana que dialoga com o cotidiano deles em aspectos macro e que os faz enxergar além nas particularidades da micro-história de uma família que poderia ser qualquer família. Eles percebem que eles conhecem aquelas pessoas e que precisam pensar melhor o próprio mundo.
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